Noites Caídas 2
Tive algumas dúvidas sobre se deveria considerar este post o segundo RM (registo magnético) da rubrica Noites Caídas, já que não vou falar de nenhum bar ou discoteca em particular, mas antes de uma esquina. Decidi que sim. Por isso ficam já a saber que as esquinas em breve deverão estar sujeitas a atribuição de alvarás e porteiro.
A esquina de que vos falo é já muito corriqueira, uma das mais frequentadas do Bairro Alto. Onde é o Clube da Esquina, precisamente. Não vou falar sobre o bar, a não ser duas considerações que me parecem importantes: Vende barato e tem um porteiro educado, que até reserva copos de plástico no bolso se quisermos ir para a rua. Eu vou quase sempre para a rua.
Na sexta-feira passada estive com alguns amigos "a segurar" uma das paredes da esquina. Não despegámos de lá até ficarmos com marca nos casacos. Mesmo à custa do bem estar da M. que detesta o BA "Este síto é horrível e degradante!" e sob as lembranças do Asdrúbal que ali cresceu, acabámos por ficar à esquina da noite e de um certo Portugal até que nos apetecesse. E apeteceu muito.
A F. virou-se para o negócio das sondagens e perguntava a toda a gente em quem ia votar (!), o C. esteve quase uma hora a falar com um casal de lésbicas sem saber (?!), eu e duas amigas apanhámos a lésbica a jeito (salvo seja) e desatámos a apurar toda a verdade (dúvidas, questões, filosofias, explicações hormonais, quando descobriste, como é que a família aceitou... etc), foi lindo. Confesso que esclareci umas coisas. Uma delas é que adoro homens.
Tudo à esquina. E vai mais um copo de plástico para o parapeito.
A determinada altura, foi-nos feita uma revelação: 50% da população flutuante do BA é gay. Mau. Isso é que não. A Lolita não achou piada nenhuma. "Uma coisa é a gente já saber disso há um tempo, outra é ser uma fonte credível a confirmar" (o que ela queria dizer era: uma coisa são as mulheres gay, outra são os homens, que estes fazem falta!).
Pois é. À partida a sondagem indicava maioria de votos para o BE, mas o melhor da esquina é que havia gente para tudo. Paulo Portas estava em grande, Santana Lopes em baixo mas resistente e Sócrates não estava nada mal (mas se ali tivesse passado teria ouvido muitos conselhos grátis para a sua carreira). A F. contou também um voto para a CDU. Homenageou-se ainda a perseverança de Garcia Pereira e lembrámos o mítico e bizarro POUS. Houve ainda uma sublevação monárquica muito pouco a propósito.
Tudo à esquina. Empresta-me aí dinheiro para um vodka tónico. Olha traz-me um gin também. (Passados uns minutos). Olha lá, isto é o gin ou é o vodka? Não sei. Deixa ver. (Trocaram os copos). Olha lá, isto sabe tudo ao mesmo. Estranho. Acabaram os dois no parapeito (vazios).
Na esquina conheci ainda um italiano milanês que me falou maravilhas de Lisboa. Milão é feio, é frio e não tem piada nenhuma. Disse ele. Lisboa é como Roma, é o máximo. Disse ele. Eu que não conheço nada de Itália aceitei o elogio e achei que Milão podia ser feio, mas ele era bem giro. Sorte a do BA, que tem uma esquina com gente assim, que lhe sustenta as paredes e lima as arestas dos vértices. Sorte a nossa, que temos onde nos encostar nestas noites de seca que tão mal faz às hortas, mas que tão bem deixa as noites cairem sobre nós.