26.4.06

acreditar sempre

Em resposta ao repto lançado pelo Tomás do Hoje há conquilhas, amanhã não sabemos..., resolvi evocar o trabalho da Acreditar.

Não conheço verdadeiramente de perto o trabalho desta Instituição Particular de Solidariedade Social que se dedica a apoiar crianças com cancro, mas conheço bem essa maldita doença. Vi dentro de portas o que é padecer dela e como extrapola o organismo do doente para cada centímetro dos seres a ele afectivamente ligados. Pior do que a morte é a doença, como caminho prolongado para o último dia da nossa vida terrena. Pior do que a morte é desejá-la.

Acredito que a Acreditar é capaz de adiar esse sentimento de desistência numa criança. Acredito nas pessoas que lá trabalham, porque a minha irmã e o meu marido, que em determinadas ocasiões das suas vidas profissionais colaboraram com a Acreditar, partilharam as suas experiências comigo. Não acredito que a vida de uma criança valha mais do que a de um adulto, mas acredito que por elas a morte pode esperar... sem ser tão matreira.

banho de espuma

Já há mais de vinte anos que não tomava um banho de imersão. Logo desde cedo comecei a reclamar o duche dos crescidos, era mais giro. Ontem quebrei o tabu em virtude de umas costas, e de um esqueleto em geral, em muito mau estado. Pelo fim da tarde foi a loucura, dei finalmente uso a uma bola estranha, com aspecto de suspiro de pastelaria, que a G. me trouxe de Londres há dois anos. Lá dentro, como a G. tinha avisado, vinha um papelinho futurologista, como se de um bolinho da sorte chinês se tratasse. A frase é estranha e aceito sugestões:

"A chocolate spot still has it's uses..."

Não percebi.

O banho soube-me bem mas fiquei com uma quebra de tensão. Ia adormecendo a meio o que também não é conveniente, arrisquei-me a sair de lá género passa do Algarve. As carnes ficam moles e o cérebro pára de funcionar. A conta de água também ameaça subir com estes disparates imersivos. Devo demorar mais vinte anos a cometer o mergulho doméstico, a não ser que a G. me traga uma bola com uma frase de jeito.

it´s a Sony*

A paixão fica antes do amor, abaixo da amizade e nos espaços em branco da consciência.

in Gola Alta*

É assim que ficamos... em branco.

dia 26 de Abril

23.4.06

eu queria ir

E depois não querem que o mundo esteja em desequilíbrio... Onde está a sustentabilidade do desenvolvimento quando há milhares de bilhetes à venda para o Rock in Rio e nem um sequer para os Kings of Convenience, na Aula Magna, e para os Artic Monkeys, no Paradise Garage? Claro, há um pequeno pormenor de espaço, o Parque da Bela Vista é muito maior, e este post só serve mesmo para perguntar se alguém terá por aí um bilhete ou dois a mais...

22.4.06

sms

Uma viagem a Compostela, um campeonato em azul ganho, um livro, um sonho, uma dúvida... Ser destinatária é uma felicidade. Às vezes não lhe dou importância, mas um telemóvel inteligente, que acende e toca no preciso momento em que sou lembrada, recorda-me a simplicidade das relações humanas. Ou ficam connosco ou não ficam. Ou guardamos os outros ou não os guardamos. Os sms são ainda mais básicos.

20.4.06

um dia

Ontem tive uma conversa via msn que me deixou de lágrimas nos olhos de tanto rir. A velhice é uma coisa lixada pois é, mas não te preocupes que eu não chego a velha, dizia eu. Chegas, chegas, diziam-me. Fazendo fé na longevidade oferecida assim, on-line, imaginei-me velhota com as minhas amigas num lar ou a encalharmos nas movimentadas artérias da Baixa-Chiado, à procura da última casa de chá ou, quem sabe, de num bar lounge que por essa altura já será local de roteiro histórico...

Embalada pelos takes instantâneos e viciantes do msn, dei comigo a fazer humor negro, ou pelo menos a tentar... No filme via-nos a todas de dentadura postiça, cabelos loiros (acabamos todas loiras, não é Lolita?, disfarça mais os brancos), a maquilhagem fora de prazo a formar gretas nas pálpebras, o baton nos dentes, eu a parecer-me com uma árvore de Natal, cheia de bijuteria, ou jóias verdadeiras (não vá ser velha rica), a F. muito composta e indisposta a ralhar com os jovens, a R. com o i-pod preso por arames e adesivos, a G. eterna hippie de flores no cabelo (ela ainda terá cabelo), a C. a insistir nos saltos altos mas a andar toda torta, a S. uma senhora do alto dos seus saltos agulha, a A. a ensaiar o tango e a desafinar blues, a T. magérrima nas suas calças Padra, a J. de mini-saia e a fumar, a F. de sapatilhas florescentes compradas numa loja vintage, as Ss. cheias de sacos da compras...

Discutiremos as diabruras e as amarguras da juventude e relativizaremos todas as ansiedades profissionais e emocionais. Seremos chatas e trocaremos os nomes todos. Falaremos sem parar, mas esqueceremos pelo meio o que estávamos a dizer. Arriscaremos dizer mal dos maridos e namorados das outras, alguns já enterrados. Ensaiaremos ainda grandes aventuras, como conseguir estar acordadas depois das dez da noite, e mentiremos sobre a incontinência e as investidas sexuais. Contabilizaremos rugas e peles, mas ainda acreditaremos em Spa's e cremes anti-celulíticos. Os nossos filhos e afilhados serão uns queridos e terão orgulho em nós, mas não seguirão nenhum dos nossos conselhos sobre a vida. Descobrirão por eles próprios, como nós.

Assim não parece muito mau pois não?

19.4.06

drogas leves

Aviso:

Consumir moderadamente. De preferência fora do local de trabalho, porque pode causar graves perturbações...

16.4.06

em guarda

"Quando pedi aos meus leitores que fossem ao Rossio para lembrar simbolicamente as quatro mil vítimas do massacre de 19, 20 e 21 de Abril de 1506, nos dias em que passam 500 anos sobre o acontecimento – de forma absolutamente voluntária e desprovida de uma qualquer estrutura ou “organização” – nunca imaginei que poderia ser intimado a explicar-me e a expor as razões subjacentes a tal iniciativa (...) tenho medo do esquecimento."

Rua da Judiaria

Que importa se foi há quase 2000 anos, se há 500 ou se há 60? A história da Humanidade é feita de atropelos à liberdade de expressão e de crimes cometidos em nome de deus. Acender uma vela no Rossio ou em casa, ou simplesmente dentro de nós, em memória de massacres passados, pode fazer muito mais pelo nosso futuro do que imaginamos. Pode ser um sinal de que estamos atentos, em guarda. O esquecimento é um tiro no pé. Tem razão o Nuno Guerreiro. Felizmente, uma das boas razões de ser da diversidade humana e cultural é que cada um traz à memória o que a memória fez, e faz, por si. É isso a riqueza da civilização, onde ela ainda existir.

libertação

Sentes que Te abandonei? Diz-me a verdade. Mais uma Páscoa sem Te acompanhar na Via Sacra, sem aprender contigo a humildade na cerimónia do Lava Pés, sem receber o Teu corpo e beber o Teu sangue na Última Ceia. .. lá vão uns anos desde que vivo a Tua paixão e ressurreição fora do templo católico.

Conheces bem o meu argumento... Construí o meu templo fora dos altares canónicos. Sucumbi, conscientemente, à trajectória que não vela pelos rituais da Igreja Católica Apostólica Romana que me viu nascer e é legítima em cobrar-me a costela de Adão.

O meu templo não tem paredes, senão aquelas que o mundo profano, no fundo aquele em que sempre caminhaste, habita. Sabes? Eu sinto todos os anos, todos os Sábados de Aleluia, todos os dias, o valor do Teu sacrifício, a força da Tua libertação terrena, a ascenção a um plano superior que desconhecíamos - a eternidade.

Ofereceste-me a liberdade. Essa á a minha Páscoa.

Nunca me deixarás cair.

Adoro-te.

13.4.06

não há sol que hoje me derreta

Nem palavras quentes, nem auto estimas elevadas, nem primeiras boas impressões. Hoje não há segundas oportunidades. Amanhã vê-se, mas avizinha-se mau tempo.

12.4.06

purezas

O novo segurança do edifício onde trabalho é um achado. Não sei se o voltarei a ver, porque o forte está entregue a uma empresa que anda sempre a rodar os guardiões. Ontem, quando saía já de noite, perguntou-me se podia levar os jornais mais antigos para se entreter. Eu respondi que sim, mas achei estranho porque eram jornais mesmo antigos. Ele depois disse a medo: "É por causa dos Sódócos". Hã? "Sódócos", reafirmou e corou. Ahhhhhhh... "Já sei aquele jogo com números?". Sim era isso. O senhor não me queria ofender com Sodokus.

milagres de luxo

A loja da Cartier, na Rua Garrett, tem umas vitrines que nos põem mais magras. Hoje passei mais tempo a olhar para mim do que para aquele anel de ouro branco e diamantes... A minha imagem era linda. E assim desci feliz o resto do Chiado, com a beleza roubada no corpo e uma prenda que trouxe da escalada ao Bairro Alto. Ainda parei na Fnac e comprei os "Despojos do Dia" e o concerto dos Gorillaz. E assim convenci-me, sem ser convencida, que a vida é bela.

11.4.06

momento sagrado

No meu testamento escreverei que abdico da supremacia da minha razão, da inércia da minha paixão, do desperdício dos dias sem gana, das horas mortas que não ressuscitei. Nesse testamento escreverei todos os dias um pouco de mim que não quero levar. No meu testamento não há herdeiros, só cúmplices.

momento profano

Sou demasiado terrena. Muitas vezes só consigo ver com as mãos. Já dizia a madrinha materna. Também tenho a mania de cheirar tudo, até as couves no supermercado.

momento mel

Deixa-me ficar aqui. Sempre do contra. Que bom não concordar, nem ser por mal, nem ser por bem. Ser contra. Se assim não for, para que servem os amigos senão para andar aos encontrões?

momento fel

Estou a ficar um bocadinho farta de gajas convencidas. Se me tornar numa avisem-me e insultem-me. Os amigos, e demais leitores, também são para estas coisas.

fica para amanhã

Como ultrapassar a crueldade de um momento que se divide em dois? Chega sempre. É uma chatice. Não se tratam de opiniões divergentes, mas sim daquela altura em que olhamos para o lado e o outro foi, ou já tinha ido há muito, em direcção oposta. Não tem culpa. Ninguém tem aliás. Nunca haviam dito que seguiam o mesmo caminho, convenceram-se ambos que só existia uma via. Talvez se encontrem no Entroncamento, seria um fenómeno. Amanhã vê-se.

amizade em carne viva

A amizade, tal como o amor ou a paixão, também é feita de química. É a beleza interior virada do avesso. É a beleza que também se vê. E nesse sentido, a atracção fisíca também passa pela amizade. A amizade é tão sensorial como todos os outros sentimentos. Não será menos nobre por isso. A amizade apalpa-se. Às vezes até somos amigos de gente oposta. Há por aí muito boa gente linda por dentro que não encontrou amigos, ou não os fixou. Como se explica isso? Porque também para os amigos temos de ser atraentes. Negar essa evidência pode prejudicar gravemente a saúde mental e física. Em físico nos entenderemos sempre.

5.4.06

hoje

"As Vampiras Lésbicas de Sodoma", pela Companhia Teatral do Chiado*, no Teatro Estúdio Mário Viegas. Vou só com mulheres... Não me perguntem mais nada, por favor.

*Ao fundo da ficha técnica lê-se: Um Grandioso Espectáculo Off-Parque Mayer!!! Sempre provocadores...

silly in the rain

A chuva dá-me para fazer coisas parvas... É sempre nestes dias que tenho mesmo de ir à rua comprar qualquer coisa, que tenho mesmo de ir ao cabeleireiro esticar o cabelo, que tenho mesmo de ir ao teatro, que tenho mesmo, mesmo, mesmo de ser tontinha. O tempo não me compreende, mas eu também não vou explicar.

4.4.06

outros comboios que deviam partir ou a falta de pachorra para...

... vegetarianismo e macrobiótica, a verbosidade na defesa das baleias e de mais não sei quantas espécies em vias de extinção, o culto beato da beleza natural, discotecas de Lisboa, os defensores da música portuguesa exclusivamente cantada em português, editoras a lançarem livros em catadupa sem tempo para respirarem nos expositores, as lojas dos chineses, os restaurantes que servem pequenas porções em pratos grandes e mixórdias à la Knorr... e de mais não me lembro agora. Acudam-me que eu hoje estou impossível. Ou então arranquem com o TGV de uma vez por todas.

quotas femininas

conversa de búzios

- As mulheres são como o mar. Perigosas. Tenho-lhes muito respeito. E tenho muito respeito ao mar...

E assim acabou mais um telefonema.

PS - O respeito é bonito. O medo é perda de tempo.

beauty for the boys

O Benicio perdeu o comboio...
Não vale a pena correrem na linha de ferro que ainda podem partir o salto. Não se cansem a ir para a bilheteira que nem nas carruagens de mercadoria arranjam passagem. O comboio da diferença de forma dos sexos já partiu, com chegada, quem sabe, à androgenia como diz a minha Sony.

Tem razão a Sony e tem razão a Cristina. A primeira aceita o facto impassível (as netas ou as bisnetas que se amanhem), a segunda sobe para o palanque para mover as plateias da discórdia que tanto a entusiasmam e lixa-nos o juízo a lamentar-se da semelhança desarmante nos hábitos de toucador entre gajos e gajas.

Se eles se querem depilar, assim seja. Se eles querem ir à manicure, assim seja. Se eles aplicam máscara no cabelo uma vez por semana (ai de mim que já lá vai um mês), assim seja. Se eles, bolas, se eles querem ser lindos como nós, assim sejam. Se nós continuamos a gostar dos que perderam o comboio, Amén e paz na terra para todos.

Eu confesso, ofereci um boião de creme descongestionante para as olheiras do meu homem. Mas ele que não se ponha com ideias e não abuse. Até agora, a coisa vai bem encaminhada, o frasquito já passou do prazo e os olhos continuam os de um boxeur.

o último reduto

Quanto tempo falta até eu pôr os meus dedinhos dos pés ao léu? Todas as primaveras, a mesma dúvida e as mesmas reticências instalam-se. Mangas cavas e decotes são dress code "intersazonal", os trapos frescos são transversais aos 365 dias do ano... Mas sandálias e dispensa de meias... ui ui... demoram. O frio fugiu-me todo para os pés. Sou maluca o suficiente para andar de vestido de piquenique e botas da montanha ou, as minhas preferidas, de rodeo. Ou, melhor ainda, dormir de alcinhas e meias... Vale a pena pensar nisto? Nahhhh...

a marmita

É a crise eu sei. Microondas, tupperwares, sacos e saquinhos, os restos do jantar, um petisco, a última receita sacada da net... Valha-me Deus. Não tenho paciência. Comer no trabalho é deprimente. Armo-me em rica e vou ao restaurante, que luxo! Descer o elevador, escolher a porta, entrar, sentar, escolher, porem-me o prato à frente, saberem de cor que como sempre salada e nunca batatas fritas, não gosta de passas pois não, ah e vem sem queijo, e é uma água tónica com gelo e limão... E em dias de euforia sai um bolo de chocolate com três colheres.

Sim, é verdade. Sou da burguesia abastada. Ao que eu cheguei só por não gostar da marmita.

1.4.06

é mentira

Velha, recente ou descartável, não há mentira que não se possa transformar em verdade. A grande maioria dos mentirosos acredita nisso. Não é, mas podia ser.