20.12.05

a minha manhã com o Rodrigo

O Rodrigo já ia meio desconfiado. Quando a banda começou a tocar e entraram os anfitriões, coloridos e estridentes, a exigir bons dias e muitas palmas, o Rodrigo ficou com um ar sério e inquietou-se na cadeira. Depois entraram os artistas que iriam animar a manhã – os palhaços, os contorcionistas, os domadores... O Rodrigo pediu para vir para o meu colo. A seguir uma bela jovem ucraniana dependurou-se num arco junto ao tecto e fez as mais arriscadas acrobacias. Eu sentia o Rodrigo tenso no meu colo, com as mãozinhas agarradas à minha perna com medo que eu fugisse. Eu, realmente, queria fugir dali para fora... Olhei para o meu afilhado e vi que os olhos dele não brilhavam de excitação, mas sim de medo e tristeza. O Rodrigo estava deprimido. “Estás a gostar?”. Acenou a cabeça negativamente. “Queres ir embora?”. Pôs logo os braços em acção para vestir o casaco. Dois minutos depois corria alegre pela Rua das Portas de Santo Antão. O Rodrigo, quem diria, é como eu, acha o circo um espectáculo muito triste. Ele não consegue ainda verbalizar as suas emoções, mas o que ele sentiu foi pena dos artistas. E é pena, esse sentimento infame, que eu não consigo evitar sempre que vejo um cartaz ou vislumbro as caravanas de uma companhia de circo. Para curar a angústia de ambos, enfiámo-nos na FNAC a ver livros de animais e o filme Madagáscar que finalmente sacou um sorriso ao Rodrigo.