estrangeiros
Conheci há tempos um tipo francês, fotógrafo de profissão, que decidiu viver em Portugal, e ao fim de uns anos ainda não se arrependeu. Perguntei-lhe, na ocasião, abismada, porquê?! A minha pergunta caiu-lhe mal e desconfio que ficou logo a olhar-me de atravessado. Porquê?!!! Respondeu. Você já viveu no estrangeiro? Não, infelizmente. Retorqui só para provocar. Seguiu-se a habitual ladainha dos estranjas sobre Portugal, o sol, o clima, blá, blá, e não damos valor ao que temos, blá, blá, blá, e que temos Paz, bléu, bléu... Ainda esperei que ele dissesse e as mulheres portuguesas são muito bonitas, sempre tinha safado a conversa, mas não. Entre um canapé e um tónico, lá o deixei a remoer sobre os benefícios de viver em Portugal. O francês irritou-me, portanto.
Ele era meio tonto, mas quando começo a ouvir-me e a ouvir tanta gente à minha volta com vontade de emigrar, desiludidos e enfadados que estamos com o país, lembro-me dele. Ele lá terá as suas razões, que são tão legítimas como as nossas, os que estamos com um olho na fronteira. A cada país correspondem, medidas singularmente pelos seus habitantes, as alegrias e as tristezas, as obsessões e as desilusões, que de fora, ao olho do estrangeiro, são invisíveis e imensuráveis. Somos todos estrangeiros. Essa é a nossa condição, feliz mas, e talvez por isso, ignorante em casa alheia.
Ocorre-me agora frequentemente, a par de ir viver para Barcelona, Madrid ou Nova Iorque, outro pensamento que começa a ser grude: ganhar vontade de ir para fora cá dentro. O slogan é conhecido e não é, neste caso, um elogio ao turismo de habitação e às quintarolas românticas que povoam o nosso berço... É um grito de liberdade. Acredito que as fronteiras que criamos interiormente são mais limitadoras que as fronteiras geo-políticas. A vontade de sair do país não passa muitas vezes de uma vontade de sair de nós mesmos, quebrar barreiras, cruzar avenidas interiores ainda por inaugurar.
Jamais serei feliz em Barcelona ou em Nova Iorque se continuar cá dentro, sem ter ousado ir para fora. Quando for, não será para fugir (e se tenho vontade!), será para me expandir. Aí sim, colocarei a bandeira verde e rubra em terra alheia, sem vergonha nem raiva, porque das misérias deste país só eu e todos os portugueses sabemos. Os estrangeiros que continuem na ignorância.
5 Comments:
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Acho que não vale a pena encontrar soluções para a nossa insatisfação em espaços físicos diferentes sem primeiro diagnosticarmos se o problema (se é que é um problema??) é de alma, coração, trabalho, família, país, ou tudo junto.
Tiraste-me as palavras do pensamento sony hary. Concordo perfeitamente com o teu comentário, embora por vezes seja mais fácil e menos penoso passar à frente o diagnóstico!
Tudo o que esse tal amigo francês te disse é realmente verdade. Já vivi 5 longos anos fora do meu país e apercebi-me, (com meros 11 anos) que temos um país exelente e bonito. Não falo do clima, visto ter vivido num que achei melhor, mas toda a beleza natural e toda a sociedade que temos (que, acredita, sou uma das maiores críticas) já ter incorporado tantos conceitos que em partes do mundo não fazem seuqer sentido.
No entanto, ao dizer isto, não digo que estejamos de certa forma a regredir.
E agora, depois de ter voltado já tenho coragem para dizer que adoro o meu país e, que me aptece voltar outra vez para outro qualquer sítio, mas sempre para voltar, porque secalhar (apesar de na altura não ter gostado) foi uma escapatoria com a qual aprendi a dar valor ao que emos ou não.
O lugar a que sentimos pertencer nem sempre é o mesmo onde nascemos ou crescemos, cabe-nos a tarefa de procurá-lo com o coração e com muita coragem, mas uma vez encontrado sentimo-nos como quem chega a casa depois de uma longa ausência. A próxima vez que encontrares um estrangeiro que decidiu viver em Portugal (ou a mim) não perguntes porquê, não existe razão nessas escolhas, felicita-o.
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