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Nos dois últimos sábados, o Jornal da Noite da SIC presenteou-nos com reportagens da vida como ela é, ao jeito do jornalismo de proximidade a que a televisão de Carnaxide nos habituou. A SIC mudou para melhor a maneira de contar estórias, disso não há dúvida. Às vezes sobra-lhe em forma o vazio de conteúdos, outras o conteúdo transborda a forma, mas em ambos os casos safa-se com os trejeitos de rigor, objectividade e cuidado visual que continuam a marcar o seu percurso neste condomínio fechado em que habitam os média portugueses.
As duas reportagens de que falo detiveram-se no acto de parir e nos processos que o coadjuvam (enfermeiras, médicos, serviço de refeições, lavandarias, desabafos, lágrimas e afins) e nos jovens adultos trintões que ainda habitam no "Hotel Mamã". Foram dois trabalhos que me deram náuseas, mas por razões completamente distintas.
O primeiro, nos décors da Maternidade Alfredo da Costa, confesso que deixei logo de ver quando uma senhora começou a gemer para a câmara, escancarada e a dar à luz da TV a cabecinha do inocente que das suas entranhas saía. Entre pernas, salvem-se as devidas diferenças no perímetro da coxa e nos designs da depilação, somos todas iguais. Exceptuando quem nasceu de cesariana, também saímos todos pelo mesmo sítio. No ciclo preparatório já a minha professora modernaça de ciências me tinha dado a ver uns 'slides' com a mesma operação dilatação, saída, relaxe e costura. Nada de novo, portanto. Anos mais tarde, a maluca da professora de Psicologia, mãe de quatro a caminho da quinta, dizia-nos para olharmos o Estádio da Luz em dia de derby e pensar que todos que ali estavam tinham nascido... Quando o banal é visionado, perde o encanto natural que às coisas banais sempre resta. Num exercício de zapping ainda fui ouvindo uns desabafos das enfermeiras da casa, da senhora a mandar vir toalhas, da pequenita de 4 anos que foi conhecer o rival sem dentes, do papá a chorar de comoção... enfim. Desisti. Pelas portas da maternidade reservo-me a entrar para visitar ou, quem sabe, ser visitada.
Segunda reportagem. A vida também como ela pode ser. No "hotel mamã" os hóspedes a que a SIC deu tempo de antena (desconfio se não terá sido de propósito...) eram do tipo inquilinos indesejáveis, capazes até de concorrer a um casting para um thriller psicológico... Esta reportagem teve a sua graça, embrulhada em análises sociológicas sobre a tendência dos jovens do Sul da Europa, sobretudo do sexo masculino, em permanecer em casa dos papás. O que me enjoou mesmo foi a leveza com que os jovens da reportagem encaravam a relutância em fazer-se à vida. Eram todos adultos, se bem me lembro na casa dos trinta, que preferiam fazer férias melhores e ter a cama feita e roupa lavada, ou continuar a viver numa zona xpto em vez de ganhar o seu espaço e assumir responsabilidades. Não me pareceu que algum deles estivesse a passar por um momento particularmente difícil da sua vida, que precisasse temporariamente dos mimos paternais (que tão bem sabem), que ganhasse o ordenado mínimo e não tivesse possibilidade de arrendar ou comprar casa, que estivesse doente... Desses não rezou essa reportagem, porque tal como a miséria que o povo vai segredando, também há muita tristeza encoberta.
No decorrer da reportagem, em que fiquei literalmente de boca aberta, lembrei-me desses jovens adultos que não ganham para a vida que merecem, no final da reportagem só imaginava as minhas amigas solteiras e boas raparigas num jantar romântico a ficarem com a sobremesa entalada quando o rapaz cheio de auto-confiança lhes comunicasse que ainda vive em casa dos papás... E ri-me. Ri-me disso e ri-me da miséria de mentalidade aqui tão descoberta, na vida tal como ela é. Fazer o quê?
4 Comments:
Variante de provérbio:
Diz-me como os educas, dir-te-ei quem és!
P.S. - Uma vez li uma reportagem; em Itália exitem cursos para aprender a ser sogra, uma vez que muitos filhos ficam a viver em casa dos pais após o casamento!
É isso mesmo, fazer o quê?
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